terça-feira, 28 de dezembro de 2010

quadro de honra #3

por motivos de copyright, prefiro deixar links para o youtube em alguns dos casos. em havendo interesse, podem sempre pedir-me os mp3's de alguma das malhas. still, google is your friend :

shanell ft. mika means & jovi rockwell - la la la / teairra mari ft. mavado - coins

ainda não me decidi sobre qual destas duas versões gosto mais. o instrumental recupera aquele tom ameaçador que tem vindo a rarear no dancehall pós-choradeira (e refém do auto-tune) de um modo que não permite refrear os ânimos de modo brando. tem os dentes cerrados de tal maneira, que apenas uma voz feminina lhe poderia conceder o espaço necessário para não sucumbir à auto-fagia. o que poderia ter sido o caso de rated r, não estivesse tão dependente da catarse. e da maturidade forçada que isso acarreta?

a versão da shatell (à qual nunca prestei grande atenção, apesar de alguns momentos de valor em shut up n listen) prende-se mais na sua aura jamaicana, com o la la la subliminar a aparecer de um modo mais insistente no subconsciente para se converter no próprio (proto?) refrão. é um fluxo, onde as prestações mcing não ofendem sem serem completamente relevantes e acaba por desembocar sempre em "i'm gonna make you love me like that". a ameaça toma forma lírica. e apesar de imperar um certo conservadorismo acabo por a aceitar de bom grado enquanto statement hipnótico de uma malha indecisa quanto a revelar-se uma canção de pleno direito.

'coins' é uma anomalia que espelha o próprio perfil discreto da teairra mari. numa altura em que parece que at that point nunca irá ver a luz do dia, ficou confinada ao leak rasteiro ('automatic' com a nicki minaj também teria merecido melhor sorte). compreensível, não só pelas razões que já anteriormente tinha mencionado (embora pudesse ter feito parte de sincerely yours), mas também por ser difícil encontrar-lhe grande potencial comercial. desta feita, são as buzinas a enfatizar toda a tensão de um objecto que acaba por habitar o crossover entre o dancehall e o r'n'b de um modo que acaba por soar bastante natural. e que deveria ter mais oportunidades. com o mavado a oferecer um contraponto masculino bem vindo, a teairra incute toda uma coolness ao tema sem que isso implique um ambiente mais rarefeito. antes um fio condutor digno para uma canção reveladora das suas capacidades camaleónicas no espaço de três minutos e meio.

florrie - left too late

sem se desviar de uma fórmula que ajudou a criar, 'left too late' recorre ao manancial rico de opções estéticas da casa xenomania para uma solução tão eficaz quanto deslumbrante. dance-pop sem grandes segredos, na senda de mini-viva ou girls aloud (nos momentos menos exuberantes), onde o labor minucioso prestado à arquitectura sónica da canção não desvirtua uma vulnerabilidade palpável. processual, na medida em que encadeia os momentos em crescendo, com recurso a uma ponte que desemboca naquele tipo de refrões larger-than-life que facilmente se vêm a revelar tão exagerados quanto inócuos, mas igualmente sensitiva por nunca pôr em causa o sentimento geral da canção em detrimento de uma construção mais maniqueísta.

soundgirl - i'm the fool

isto é tudo aquilo que a santogold nunca poderá vir a ser e uma das razões (por estar nos antípodas) pelas quais embirro solenemente com a intransigência indie. ou então com aquele discurso muito pós-moderno que invoca a pop e o r'n'b sem um conhecimento de causa. talvez por se mostrar tão distante desse sectarismo, i'm the fool' consegue soar tão fundamental. e sem deixar de ser igualmente espertinha. nada mais me apraz a dizer. está tudo aqui : "this ain't glee / i'm back on the wire / if it was twilight / i'd be a vampire".

pinch - croydon house

nunca nutri grande admiração pelo pinch. underwater dancheall era uma premissa entusiasmante que veio a revelar uma militância dubstep demasiado presente, e acabava por cair no campo da über-seriedade sabotadora. 'croydon house' não se afasta dessa mesma austeridade, mas consegue subsistir nesses mesmos propósitos sem recorrer a uma agenda específica que dependa de tiques urbanos ensimesmados e, em última análise, cansativos. se o reverb inicial, muito echospace, demasiado reason, chega a assustar, rapidamente passa a um plano secundário para dar lugar ao ritmo. é este que faz de 'croydon house' a melhor coisa do pinch desde 'qawwali'. elemento central, dispõe-se em várias camadas que se enredam no acerto harmónico do sub-grave (que acaba por ter o seu protagonismo no meta-crescendo dos últimos dois minutos) sem nunca tomarem a dianteira. um kick 4/4 enfatizado pelos shakers e congas que parece desacelerar com a entrada daquelas palmas tão em voga no grime circa 2004, para um efeito tão óbvio quanto intrigante. o reverb mantém-se, nas profundezas, mas já há muito que foi esquecido na pan-generalidade de um tema que recupera o sentimento de isolamento do melhor loefah sem ser condescendente para com os seus ensinamentos. é aquele cinzentismo que não se alimenta somente da sua tensão lacónica, para meter o corpo a mexer de múltiplas formas. um one of a kind que duvido que se repita proximamente.

rangers - dome city

confesso : a escolha mais inusitada de suburban tours. 'dome city' está longe de ser uma canção ou mesmo um instrumental de pleno direito. assemelha-se mais a um interlúdio, não fosse aparecer quase no final do álbum. mas, apesar de fazer mais sentido perpetuar 'deerfield village' ou mesmo 'out past curfew' (versão nocturna/ameaçadora de uma comprimento de onda empático), 'dome city' é uma miniatura instrumental que acaba por cristalizar todo o sentimento de abandono que prevalece em suburban tours em formas mais ou menos prazenteiras. (partindo para um paralelismo não tão preciso, mas recorrente e eficaz) é um pouco como 'bocuma' consegue ser tão ou mais reveladora do universo dos boards of canada do que os temas per se. 'dome city' é, factualmente, uma redoma. o riff encerrado naquelas duas notas de guitarra (e aquele break circular a fazer todo o sentido) tanto pode ser o olhar dos subúrbios para a cidade na sua intangibilidade, como o oposto. um eterno-retorno, permitindo a extrapolação cinética. não é música de viagem, pois o escape é mental, é música de regresso. como a everyday life vigente.

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